Crónicas da liberdade
No jardim da liberdade
Como sempre a noite torna a vida mais completa. Tinha andado o tempo suficiente para apreciar um velho banco de jardim. Não era um banco qualquer nem um jardim qualquer, era o meu banco e o meu jardim. Meu e de todas as memórias que tinha. O banco dos Chapas, das Anas, das Beatrizes, das Isabeis, dos Migueis, dos Marrecos e de tantos outros que se consumiam no tempo sem darem noticia de que o tempo é uma avenida na qual só se caminha num sentido.
Era doce a sensação de estar ali. Á minha frente, um pequeno lago artificial servia de refugio a alguns patos coloridos que me pareciam os mesmos de há anos atrás. No meio do lago um bar. Tempos houve em que não existia, e o silêncio daquele jardim era ouro para uns quantos grupos de rapazes e raparigas que faziam daquele jardim o seu refúgio das realidades familiares ou simplesmente o seu refúgio para uma boa noite de conversa. Também recordo os tempos em que o bar se transformou no aglutinar de novas gentes e de lindas trocas de olhos, de cumplicidades ingénuas e de enamoramento.
Agora ali estava eu. Sozinho, e as vozes que ouvia não eram desconhecidas. Eram vozes daqueles tempos. Foda-se. Foi tão bom ter vivido ali, ter os amigos que tive. Os jovens nunca se apercebem da importância dos lugares, antes de deixarem de ser jovens.
Perdido na imensidão das memórias, nem dei pela presença de uma figura feminina que se tinha aproximado. Só quando perguntou se podia sentar-se, olhei para ela. Não muito alta, de cabelos pretos e compridos, nariz não muito grande mas arrebitado, um ainda belo par de tetas. Vestia umas jeans e uma camisa branca, um casaco de cabedal, ou a imitar, protegia-a do frio.
Respondi que sim, que o lugar era de todos, como sempre tinha sido. Nunca se negou a ninguém o direito a se sentar ali. Perguntou-me se tinha lume. Procurei nos bolsos e encontrei um velho isqueiro. Não pude deixar de sorrir, era o meu velho isqueiro alimentado a petróleo. Uma raridade e preciosidade. Acendi-lhe o cigarro que ela tinha colocado nos lábios. Uns lábios cheios, carnudos que me faziam recordar alguém. Mas a noite era das minhas memórias. Não me apetecia falar, por isso permaneci em silêncio. Um silêncio que ela interrompeu quando me perguntou onde vivia. Olhei para ela devagar e sem pensar muito respondi que ali, aquele lugar era a minha casa. Ficou espantada, há anos que frequentava o sítio, quando vinha passear o seu cão, e não se recordava de me ver. Eu quis então saber se o há anos representava muitos ou poucos. Trinta e cinco, respondeu, com um sorriso. Mentalmente voltei aos meus doze ou treze anos e fui percorrendo o caminho das memórias nos anos que se seguiram. Nada. Não me recordava dela, ou pelo menos de nenhuma miúda com uma face semelhante. Só os lábios me faziam aproximar de alguém, disse-lhe que desde há muitos anos, embora ausente daquele lugar, lá tinha deixado a minha alma. Sorriu-me com um brilho nos lábios e no olhar. Olhou para o chão e quando voltou a levantar os olhos eu sabia o que ela ia dizer. Manel! Disse, já nem dos amigos te recordas? Fiquei sem palavras, quem seria esta mulher que me conhecia tão bem e que eu aparentemente desconhecia? Voltou a sorrir face ao meu espanto. Apanhou o cabelo com as mãos tornando-o um pouco menos volumoso, comecei a recordar a face de uma menina, a irmã mais nova de uma das minhas melhores amigas. Olhei novamente pra ela, agora sim recordava aquela miúda franzina que costumava aparecer agarrada á irmã.
Afinal a minha casa ainda tinha gente conhecida. E pelo aspecto dela valia a pena passar a noite ali, a conversar sobre o tempo em que o tempo não existia.
Era doce a sensação de estar ali. Á minha frente, um pequeno lago artificial servia de refugio a alguns patos coloridos que me pareciam os mesmos de há anos atrás. No meio do lago um bar. Tempos houve em que não existia, e o silêncio daquele jardim era ouro para uns quantos grupos de rapazes e raparigas que faziam daquele jardim o seu refúgio das realidades familiares ou simplesmente o seu refúgio para uma boa noite de conversa. Também recordo os tempos em que o bar se transformou no aglutinar de novas gentes e de lindas trocas de olhos, de cumplicidades ingénuas e de enamoramento.
Agora ali estava eu. Sozinho, e as vozes que ouvia não eram desconhecidas. Eram vozes daqueles tempos. Foda-se. Foi tão bom ter vivido ali, ter os amigos que tive. Os jovens nunca se apercebem da importância dos lugares, antes de deixarem de ser jovens.
Perdido na imensidão das memórias, nem dei pela presença de uma figura feminina que se tinha aproximado. Só quando perguntou se podia sentar-se, olhei para ela. Não muito alta, de cabelos pretos e compridos, nariz não muito grande mas arrebitado, um ainda belo par de tetas. Vestia umas jeans e uma camisa branca, um casaco de cabedal, ou a imitar, protegia-a do frio.
Respondi que sim, que o lugar era de todos, como sempre tinha sido. Nunca se negou a ninguém o direito a se sentar ali. Perguntou-me se tinha lume. Procurei nos bolsos e encontrei um velho isqueiro. Não pude deixar de sorrir, era o meu velho isqueiro alimentado a petróleo. Uma raridade e preciosidade. Acendi-lhe o cigarro que ela tinha colocado nos lábios. Uns lábios cheios, carnudos que me faziam recordar alguém. Mas a noite era das minhas memórias. Não me apetecia falar, por isso permaneci em silêncio. Um silêncio que ela interrompeu quando me perguntou onde vivia. Olhei para ela devagar e sem pensar muito respondi que ali, aquele lugar era a minha casa. Ficou espantada, há anos que frequentava o sítio, quando vinha passear o seu cão, e não se recordava de me ver. Eu quis então saber se o há anos representava muitos ou poucos. Trinta e cinco, respondeu, com um sorriso. Mentalmente voltei aos meus doze ou treze anos e fui percorrendo o caminho das memórias nos anos que se seguiram. Nada. Não me recordava dela, ou pelo menos de nenhuma miúda com uma face semelhante. Só os lábios me faziam aproximar de alguém, disse-lhe que desde há muitos anos, embora ausente daquele lugar, lá tinha deixado a minha alma. Sorriu-me com um brilho nos lábios e no olhar. Olhou para o chão e quando voltou a levantar os olhos eu sabia o que ela ia dizer. Manel! Disse, já nem dos amigos te recordas? Fiquei sem palavras, quem seria esta mulher que me conhecia tão bem e que eu aparentemente desconhecia? Voltou a sorrir face ao meu espanto. Apanhou o cabelo com as mãos tornando-o um pouco menos volumoso, comecei a recordar a face de uma menina, a irmã mais nova de uma das minhas melhores amigas. Olhei novamente pra ela, agora sim recordava aquela miúda franzina que costumava aparecer agarrada á irmã.
Afinal a minha casa ainda tinha gente conhecida. E pelo aspecto dela valia a pena passar a noite ali, a conversar sobre o tempo em que o tempo não existia.
Manuel F. C. Almeida
4 comentários:
Sarava!
Boas descrições! Também estive lá!
beijoca
E deixas-te assim tomar pela nostalgia?... :)
O passado pega-se à pele e não sai com sabão nenhum, entranha-se até aos ossos.
Eu gosto de encontrar o conforto do passado.
Gosto de revisitar os sitios, fisica, mental e emocionalmente,milhares de vezes fui feliz nem dei conta!
Sou feliz muitas vezes, tento marcar mais nessa coluna do que na oposta.
Apesar de tudo.
Como canta Caetano Veloso, respeito muito as minhas lágrimas, mas ainda mais a minha risada.
Com o tempo aprendi a rir mais, sabes?
Sabe-me bem!
Beijos grandes
Enviar um comentário